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Filosofia x F~isica

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quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Pensamento


Santo Agostinho e a Educação

Santo Agostinho desenvolve uma teoria da educação no seu célebre livro "De Magistro" (Sobre o Mestre). Agostinho sabia do que falava: tinha sido professor, na Itália, durante uma parte da sua juventude e início da vida adulta e reflectiu muito sobre a origem do conhecimento e os meios de atingir o verdadeiro saber.
Profundamente influenciado pela teoria das ideias de Platão, que recebeu através das leituras de Plotino, o filósofo opunha-se às correntes filosóficas empiristas que viam na experiência sensível e na percepção sensorial a origem do conhecimento.
No De Magistro, Agostinho retoma a teoria da reminiscência, mostrando ao seu filho, Adeodato, que conhecer é recordar e aprender é descobrir em si as verdades eternas que cada um sem disso estar consciente. A sabedoria provem do único Mestre - Deus - que é o verbo divino e eterno e o conhecimento está ao alcance de todos os que tiverem fé.
Agostinho discute com Adeodato o facto aparente de que o ensino é transmissão do professor para o aluno através da linguagem e que esta tem duas funções: ensinar e advertir. O que é que nós podemos aprender pela linguagem e o que é que podemos aprender sem ela? Reconhecendo a existência de aprendizagem sem linguagem, por exemplo, aprender a apanhar um pássaro pela observação de um experiente caçador de pássaros, Agostinho que não são os sinais da linguagem que ensinam porque "se pode aprender sem sinais, sem linguagem, pela própria coisa".
E Agostinho acrescenta: não só se pode aprender sem a ajuda da linguagem, como a linguagem, enquanto conjunto de sinais, nada nos ensina: "um sinal verbal, como cabeça, comporta com efeito duas realidades, o sonus, o significante, que se percebe quando a voz ecoa no ar, como quando se percebe qualquer som natural, e a significatio, de que só temos conhecimento quando a coisa é percebida ou conhecida anteriormente; só percebemos o significante cabeça porque já vimos cabeças. Em consequência, as palavras não nos ensinam nada pois, ou ignoro o que significam a até não sei que são palavras ( por exemplo numa língua desconhecida); ou então sei-o e, neste caso, a palavra é um factor de recordação e não de ensino. Aprende-se o sinal pelo objecto e não o inverso. Ensinar é portanto apresentar a própria coisa aos nossos sentidos ou ao nosso espírito".
O mestre não transmite conhecimentos, mas apenas sons que chegam ao nosso ouvido; limita-se a lembrar-nos o que já sabemos. Contudo, é preciso distinguir duas situações diferentes: "quanto os sensíveis (os objectos dos sentidos), só se conhecem pela experiência directa; se nunca percebi ou experimentei o que me dizem, não compreendo. Assim, lendo mais alto a palavra sarabalas, nada aprendemos de novo; seria preciso, ao contrário, que se nos ensine o seu significado, seja mostrando-nos uma sarabala, seja substituindo o termo por meio de uma perífrase cujas palavras evoquem coisas já conhecidas. Para os inteligíveis, quer dizer as relações matemáticas e os conceitos das espécies, como o cão, o homem, as palavras também não podem deles dar-nos conhecimento; compreendemo-las graças à luz divina que ilumina a nossa razão; a compreensão é uma iluminação intelectual. Por outras palavras, o que compreendo, descubro-o não por meio de palavras, mas pela verdade que consulto dentro de mim, quer dizer o verbo, sageza eterna, o único mestre da verdade".
Agostinho chamava de iluminação a revelação de uma verdade inteligível, ou seja, eterna e universal e, como tal, objecto de uma aprendizagem que tem a sua origem em Deus. É essa a razão por que conclui que o homem não pode ensinar o homem, pois ninguém ensina a verdade a ninguém; cada um apenas é capaz de contemplar a verdade. Mais à frente, Agostinho dá conta de três situações possíveis: o aluna ignora a verdade e reagirá ao discurso pela fé, a opinião ou a dúvida e, nesse caso, nada terá aprendido; ou o aluno sabe que é verdade e aprova o que o mestre lhe diz; ou sabe que é falso e rejeita o que o mestre lhe diz. Nos três casos, o mestre nada ensina ao aluno. Se os alunos não conhecem, antecipadamente, a verdade, podem acreditar mas não aprender. Se já conhecem a verdade, não aprenderam nada de novo. Se considera que é falso o que o mestre lhe ensina, também não se regista nenhuma nova aprendizagem.
Santo Agostinho completa a sua argumentação com uma prova suplementar: o reconhecimento do desfasamento entre a linguagem e o pensamento, expresso na mentira, nos lapsos e nas ambiguidades. Mas será que o mestre que transmite, com exactidão, o seu pensamento, está a ensinar? Se assim fosse, então os alunos
iam para a escola para conhecer o pensamento do mestre e não para conhecer a verdade e ninguém é suficientemente tolo para preferir o pensamento do mestre à verdade. Só a iluminação é que permite ao aluno distinguir a verdade da falsa opinião. É por isso que o ensino se faz em dois tempos: "o professor expõe, não o seu pensamento mas a a sua disciplina: ciências, moral, filosofia. Depois, os alunos examinam por si mesmos se aquilo que lhes disseram é verdadeiro e contemplam assim, na medida das suas forças, a verdade interior. É então que se instruem".
Agostinho conclui que ensinar é fazer aprender e aprender não é mais do que relembrar aquilo que já se sabe. O olho da sabedoria não são os sentidos mas a alma e a luz que permite iluminar os objectos para que a alma os veja é Deus. É por isso que as verdades não são transmitidas nem construídas; são descobertas. O professor não é o mestre; é um aluno como o seu aluno. Ambos são alunos do Mestre que é Deus.
Então, por que razão os alunos têm a ilusão de que só podem aprender com um mestre? Os alunos acreditam que são instruídos pelo professor porque decorre muito pouco tempo entre a palavra do professor e a sua contemplação, sendo levados a crer que receberam a verdade a partir da linguagem do mestre, tomando a consecução por uma consequência.
Agostinho faz, então, um outra pergunta: se os mestres são uma ilusão, então para que servem? O mestre tem um papel muito importante, não enquanto transmissor da verdade, mas enquanto facilitador da sua descoberta, orientando o aluno, a descobrir, dentro de si, a verdade e o conhecimento. O verdadeiro papel do professor não é transmitir, mas interrogar o aluno e o seu discurso é apenas um questionamento progressivo que incita o aluno a procurar as respostas na luz do espírito. Nota-se, nesta argumentação, uma influência da teoria do conhecimento de Platão. Repare-se na semelhança entre o papel do professor e a actuação de Sócrates nos diálogos de Platão. Sócrates não afirmava que sabia; apenas perguntava para levar o interlocutor a reconhecer a sua ignorância e a descobrir, por si mesmo, aproximações à verdade.
Embora a teoria da aprendizagem, formulada por Agostinho, pareça resultar, pelo menos no que diz respeito às aprendizagens especulativas, não explica a natureza e as causas do erro. Agostinho, consciente dessa fraqueza, argumenta da seguinte forma: o engano e o erro resulta de dois factores: pela recusa em consultar a luz interior, ou seja, por preguiça intelectual, e pela fraqueza. O papel do professor é suscitar ânimo no aluno para que ele vença a preguiça intelectual e motivar o aluno para continuar a fazer perguntas que o levem a tomar consciência da verdade interior. Professor e aluno são ambos alunos do mesmo Mestre: Deus. A única superioridade do professor reside no uso de um método que é, nem mais nem menos, o método socrático: a maiêutica.
Agostinho dava a primazia aos objectos e não àquilo que se dizia deles: "e agora quero que entendas deverem as realidades significadas ser tidas em maior conta que os sinais. Com efeito, tudo o que é por causa de outra coisa, merece necessariamente menos estima do que aquilo por causa do qual é; a não ser que tu julgues o contrário". O mestre é o facilitador da aprendizagem; não é o agente: "proclamam acaso os professores que se aprenda e fixe o que eles pensam, e não as doutrinas mesmas, que eles julgam comunicar falando? Pois quem será tão estultamente curioso que mande o seu filho à escola, para que ele aprenda o que o professor pensa? Ora depois de terem explicado por palavras todas essas doutrinas, que declaram ensinar, incluindo a da virtude e da sapiência, então aqueles que são chamados discípulos, consideram consigo mesmos se se disseram coisas verdadeiras, e fazem-no contemplando, na medida das próprias forças, aquela Verdade interior de que falámos. É então que aprendem".
Em suma, Agostinho estabelece uma distinção clara entre o conhecimento das coisas corpóreas e o conhecimento das coisas intelectuais. Embora não negue que existe um conhecimento das coisas do mundo, que a nossa mente apreende e conhece através dos sentidos, Agostinho afirma que o conhecimento verdadeiro é o que se apreende por intermédio da razão. Um ensino baseado apenas nas palavras do mestre é uma aparência de conhecimento, uma vez que o verdadeiro conhecimento vem da contemplação dos objectos. É por essa razão que Santo Agostinho "afirma que nada do que desconhecemos podemos vir a conhecer apenas por intermédio das palavras. E, porque uma coisa é conhecer uma realidade e outra muito diferente é acreditar naquilo que alguém nos diz, as palavras sem um conhecimento prévio daquilo que realmente significam produzem apenas a crença como um simulacro do verdadeiro conhecimento. Quanto às verdades inteligíveis, também nada aprendemos através dos discursos, pois só conhecemos essas realidades quando pela iluminação da Verdade as contemplamos no interior da nossa alma".
Com o objectivo de orientar a educação cristã dos jovens e instruir os professores encarregados dessa educação, Santo Agostinho redigiu o tratado "Sobre a Doutrina Cristã", iniciado em 397 e completado em 426. Os três primeiros livros ensinam-nos a compreender as Sagradas Escrituras e o quarto ensina a expor aquilo que se compreendeu. No Livro II, Santo Agostinho desenvolve a sua concepção sobre a formação intelectual do cristão e sobre as artes liberais. No Livro IV, apresenta preceitos didácticos com grande utilidade para os professores. Com o objectivo de prosseguir no estudo das Sagradas Escrituras, Agostinho defende a aprendizagem do latim, do grego e do hebraico. Embora não descure as ciências da natureza, Agostinho dá uma importância muito grande à retórica, à gramática, à geometria, à música, à história e à filosofia. No que diz respeito à astronomia, Santo Agostinho chama a atenção para a importância do estudo dos astros, libertando esse estudo, contudo, da astrologia e das artes mágicas tão comuns no seu tempo.
Na obra "De Magistro", Santo Agostinho defende a doutrina do Mestre Interior, ou seja, a ideia de que o conhecimento vem de Deus que ilumina a alma, permitindo a contemplação da verdade pelo olho secreto e simples da mente. O aluno conhece a verdade não por meio das palavras dos professores, mas através da contemplação da verdade revelada por Deus. As palavras são sinais que servem de advertência e estímulo, pois Jesus é o único Mestre da verdade. O diálogo "De Magistro" formula uma clara teoria da aprendizagem. Escrito em 389, com Agostinho e o seu filho Adeodato como personagens, o diálogo conduz-nos à conclusão de que o professor não ensina nem o aluno aprende. Professor e aluno estão em situação idêntica. O que uns dizem e os outros escutam deve ser conferido á luz do Mestre Interior. Tanto a intelecção das coisas interiores como a que se exerce através dos órgãos dos sentidos sobre os objectos opera-se no interior, através da iluminação divina.
"Por conseguinte, de acordo com o Mestre de Hipona, o intelecto humano exerce actividade cognitiva quando o homem confere o que vê, escuta, lê ou pensa com a verdade inteligível que está na sua própria mente, apresentada por Deus.
Agostinho não conheceu a doutrina aristotélica do intelecto agente e, por isso, ele não confunde Deus com tal função intelectual, nem toma o poder intelectual do homem por um intelecto separado, tal como o apresentarão certos filósofos muçulmanos, ao interpretarem a doutrina exposta no "De Anima" de Aristóteles".
Santo Agostinho deixou-nos um pequeno tratado, intitulado "De Catechizandis Rudibus", onde expõe um conjunto de normas didácticas que ainda hoje mantêm a sua pertinência. "Assim, de acordo com o pensamento da Águia de Hipona, o professor não deve olhar para a própria exposição da matéria, como se ela devesse aparecer aos próprios olhos como um modelo artístico de explanação. Ao contrário, deve apagar-se, sob tal aspecto, diante dos seus ouvintes, ficando satisfeito, desde que se faça entender por eles. Desse modo, diz Santo Agostinho, o êxito do ensino depende em boa parte do professor que deve trabalhar com alegria, pois isso ajuda os alunos a tornarem-se receptivos, e torna a exposição agradável. Às vezes, pode acontecer que haja entre os alunos alguns muito eruditos e que, por alguma razão, se tornaram ouvintes. Nesse caso, o professor não deve preocupar-se. Fale, como se estivesse a lidar com pessoas que ignoram o assunto das lições; toque de leve nos temas já conhecidos e exponha com calma o que, de regra, se propõe aos incultos e aos ignorantes. Desse modo, o aluno erudito não deixa tirar proveito da aula, uma vez que relembrou o que sabia e aprendeu algo que ignorava."
Santo Agostinho mostra alguma preocupação com as aulas monótonas e desinteressantes, deixando alguns conselhos para evitar que isso aconteça. Em primeiro lugar, o professor deve motivar o aluno, mostrando alegria e entusiasmo. Agostinho aponta as seis causas do enfado e refere os remédios para sanar essa situação. O professor, por vezes, pode ficar desiludido com a falta de brilho da sua aula. O remédio para isso é evitar essa impressão, pois se os alunos não manifestarem desagrado, não vale a pena o professor desejar uma excessiva perfeição. Outras vezes, o professor lamenta o tempo perdido com as aulas e é incapaz de mostrar entusiasmo. Está a dar a aula, mas tem o pensamento nos livros que ficaram em casa. O remédio para isso é lembrar-se que o seu dever é ensinar e que os seus alunos precisam dos seus ensinamentos. Embora as aulas possam tornar-se rotineiras, o professor deve manter o entusiasmo porque está a desempenhar uma importante função social. Por vezes, o professor lamenta-se por todos os anos voltar aos mesmos assuntos.
O remédio para isso é ter consciência da renovação das gerações. Embora as lições sejam as mesmas, os alunos que as recebem são diferentes. Às vezes, os alunos ficam indiferentes aos esforço do professor e parece que não dão importância a nada. O remédio é envidar os melhores esforços para chamar a atenção dos alunos e procurar, por meio de perguntas, se eles estão a entender a exposição.
Por último, o professor pode estar afetado por algum problema pessoal ou familiar que lhe retira a força de vontade e o ânimo. O remédio é lembrar-se que os alunos não têm culpa dos seus problemas pessoais e que a dedicação aos alunos pode até ser um fator de estímulo.


http://www.multiculturas.com/delfim/filos_educ/textos/RMarques_Agostinho_%20o_mestre_sd.pdf

Importante conhecer Scoto Erígena e o problema dos Universais (Idade Média)


Uma marca bastante interessante da história da filosofia escolástica é seu começo propriamente com o nome de Scoto Erígena. João Scoto Erígena nasceu na Irlanda, dita Scotia maior , Eriu em língua céltica, donde o nome de Scoto Erígena. Pelo ano de 874 é chamado à corte culta e brilhante de Carlos o Calvo, para presidir e lecionar na escola palatina. Parece Ter falecido em França pelo ano 877. A sua obra principal é Da Divisão da Natureza (847), em cinco livros; é um diálogo entre mestre e discípulo e se inspira no neoplatonismo do pseudo Dionísio Areopagita, que Erígena traduziu do grego para o latim. Foi condenada pela Igreja (1225), e pode-se dizer que representa a falência definitiva das tentativas de síntese entre neoplatonismo emanatista e criacionismo cristão.

Erígena parte da revelação divina para, depois, penetrar os mistérios mediante a razão iluminada por Deus. Tal pretensão de penetrar racionalmente os mistérios revelados devia acabar logicamente no racionalismo e, por conseqüência, na supressão do sobrenatural, por mais ortodoxa que fosse a intenção do autor.

Eminentemente neoplatônico é o esquema especulativo de Da Divisão da Natureza : a descida da Unidade à multiplicidade, e retorno da multiplicidade à Unidade. De Deus desce-se às idéias supremas, aos gêneros, às espécies, aos indivíduos, e vice-versa. Deste modo, a divisão da natureza, da realidade, fica assim configurada:

1°. - A natureza que não é criada e cria (Deus Padre);

2°. - A natureza que é criada e cria (o Verbo de Deus, em que são contidas as idéias eternas, exemplares e causas das coisas);

3°. - A natureza que é criada e não cria (as coisas, realizadas mediante o Espírito de Deus);

4°. - A natureza que não é criada e não cria (isto é, Deus, concebido, porém, como ômega , termo, fim da realidade, e não como alfa , princípio). Como se vê, as fases primeira e Quarta coincidem (Deus = não criado), bem como coincidem as fases Segunda e terceira (mundo = criado).

O problema dos universais , isto é, do valor dos conceitos, das idéias, problema que tão cedo e tão longamente interessou a escolástica, teve uma solução radical no pensamento escotista. Que valor têm os conceitos, que são universais, em relação e enquanto representativos das coisas, que são, ao contrário, particulares? O problema tem uma importância fundamental filosófica, não apenas lógica e dialética, mas também gnosiológica e metafísica.

As soluções desse problema oferecidas pela escolástica são substancialmente, três: a solução chamada do realismo transcendente (platônica); a solução do realismo moderado, imanente (aristotélica); a solução nominalista.

Segundo a solução do realismo transcendente , o universal, a idéia de uma realidade em si, não existe apenas fora da mente, mas também fora do objeto (universal ante rem ): - é a solução platônica, geralmente adotada pela escolástica incipiente. Segundo a solução do realismo moderado , imanente, o universal tem em si uma realidade objetiva, fora da mente, mas é imanente nos objetos singulares de que é essência, forma, princípio ativo (universal in re ): - corresponde à posição aristotélica, com a doutrina da forma que determina a matéria. A solução conceptualista-nominalista sustenta que o universal não tem nenhuma existência objetiva, mas apenas mental (universal post rem ), ou até puramente nominal (nominalismo) - no mundo clássico esta posição é defendida pelos sofistas, estóicos, epicuristas, céticos, isto é, pelas gnosiologias empirista e sensitista

Sócrates e a crença que basta saber o que é a bondade para ser bom


O pressuposto básico da Ética de Sócrates – que basta saber o que é bondade para que se seja bom - pode parecer ingênuo no mundo de hoje, no qual já está profundamente gravado na nossa mente que só algum grau de coerção é capaz de evitar que o homem seja mau. Na sua época era uma noção perfeitamente coerente com o pensamento – ainda que não com a prática – da sociedade grega.

Antes dele não teria havido uma reflexão organizada sobre a ética e o "homem moral" a não ser o relativismo dos sofistas, neste sentido é inegável que ele é o "Pai da Ética. Contudo é preciso ponderar que desde períodos mais antigos havia uma identidade perfeita entre o bem comum e o bem individual tão arraigada na mente grega que talvez tal reflexão não fosse necessária ou sequer capaz de ser concebida. Só a dissociação de ambas na decadência grega é que teriam, pela primeira vez, postulado a necessidade de alguma teoria que explicasse esta dualidade.

Ao contrário da posição de Will Durant, portanto, só a decadência dos gregos, a dissolução entre uma teoria que concebia a identidade entre o homem e o cidadão e uma prática na qual os valores morais significam pouco – cujo resultado é a hipocrisia denunciada pelos sofistas – é que tornaria Sócrates necessário.

É com os sofistas que Sócrates dialoga, em um esforço para refutar seu relativismo moral cuja validação, sabe ele, significaria o fim do "espírito grego". O grande mérito de Sócrates é enfrentar de forma virulenta a hipocrisia da sociedade ateniense cuja resposta aos sofistas era apenas a reafirmação insincera dos velhos valores. Sócrates defende a identidade entre os interesses individuais e os comunitários como único caminho para a felicidade, o que implica na valorização da bondade, da moderação dos apetites, na busca do conhecimento.

Como se explicaria, então, a dissociação real de ambos, se ao homem, como afirma Sócrates, basta saber o que é bom para que ele seja bom?

Os sofistas responderam a esta questão considerando que a Ética era mera convenção social, Sócrates os refuta, afirmando que a aparente dissociação se dá justamente porque os homens não sabem o que realmente é a bondade. Esta noção perdida em meio à vaidade e a hipocrisia dominante cegaria o homem que ao invés de lutar por objetivos reais confunde-se na névoa das convenções sociais. Já se sente aqui o embrião da noção que Platão consolidará e generalizará na sua Alegoria da Caverna.

Assim ao mesmo tempo Sócrates busca uma volta às velhas tradições da Cidadania, mas para isto precisa voltar-se contra estas próprias tradições. Ele aceita os princípios gerais definidos por aquelas tradições, mas apenas como um conceito, uma categoria a ser investigada pela mente humana, rejeitando tanto a forma pela qual estes valores são apreendidos como o conteúdo usualmente atribuído a eles.

Assim ele ao mesmo tempo se contrapõe aos sofistas e aos tradicionalistas, aos primeiros por negarem uma realidade objetiva e universal aos valores éticos, aos segundos por não serem capazes de compreender a essência destes valores. Ele próprio pensa na Ética não como uma especulação abstrata, mas como uma força transformadora, capaz de trazer a felicidade a ambos, Sociedade e Indivíduo – aliás a única forma de se obter esta felicidade.

À questão sobre o que é a Justiça – para dar um exemplo prático desta dupla oposição de Sócrates – os sofistas dizem que ela é a convenção estabelecida pelo mais forte para dominar o mais fraco, os tradicionalistas a entendem como o conjunto das instituições eu definem o "Império da Lei". Sócrates diz que ambos estão certos e errados ao mesmo tempo. Os sofistas não estão errados porque a descrição deles corresponde ao estado de coisas na época, os tradicionalistas também não estão errados porque o princípio que teoricamente rege aquelas instituições seriam aqueles elevados valores da cidadania.

Mas ambos estão errados, porque a deterioração da justiça não significa que não exista objetivamente uma Justiça e que esta não seja uma meta a ser alcançada – ao contrário do que pensam os sofistas – e porque o que as pessoas entendem como justiça não é justiça de fato, apenas uma visão distorcida daquele conceito – ao contrário do que dizem os tradicionalistas. O problema ético, para Sócrates, é sobretudo uma questão de definição de termos.

Como chegar a estes valores absolutos que guiariam o homem? Sócrates não dá uma resposta absoluta, antes propõe um método para se chegar a resposta, demolindo as visões correntes, mostrando quão ilusórias eram as certezas, abalando as convicções arraigadas através de questionamentos implacáveis. Sócrates é um perguntador, disposto a arrancar as pessoas da vã certeza vaidosa na qual se encontram para fazê-las mergulhar mais profundamente em suas consciências em busca de respostas.

A elas ele não oferece nenhuma resposta, apenas a esperança que ao fim haverá respostas definitivas, mas que estas não podem ser compreendidas sem provocar uma mudança do próprio homem. A mais profunda garantia da sua ética é justamente este potencial auto-reconstrutivo da verdade quando vista sem os véus das aparências e vaidades, um conhecimento capaz de por si só, tornar o homem mais sábio e melhor.

A própria ausência de respostas em Sócrates é certamente parte deste método, ele teme que se der respostas aquela verdade acabará se cristalizando com o tempo e se transformando ela própria em mera convenção. O caminho teria de ser trilhado por cada um, enquanto indivíduo e ao mestre não caberia indicar o caminho, apenas advertir contra os atalhos perigosos.

Mas seus discípulos Platão e Aristóteles nem sempre serão capazes de compreender esta lição maior de seu mestre. Cada um deles irá interpretar a reflexão sobre os homens, a Moral e a Ética que Sócrates teve o mérito de trazer à baila como objeto de estudo segundo seus ideais de uma Cidade moralmente perfeita na qual houvesse uma harmonia entre os diversos interesses individuais e coletivos. E ambos dão respostas diametralmente opostas...

Segundo Aristóteles o que é ser?

Filósofo que sistematizou a lógica, Aristóteles definiu as formas de inferência que são válidas e as que não são, além de nomeá-las. Durante dois milênios, estudar lógica significou estudar a lógica aristotélica.

Aristóteles aplicou a lógica, antes de mais nada, para responder a uma questão que lhe parecia a mais importante de todas: o que é ser?, ou, em outras palavras, o que significa existir? Primeiramente, o filósofo constatou que as coisas não são a matéria de que se constituem.

Por exemplo, uma pilha de telhas, outra de tijolos, vigas e colunas de madeira não são uma casa. Para se tornarem casa, é necessário que estejam reunidas de um modo determinado, numa estrutura muito específica e detalhada. Essa estrutura é a casa; e os materiais, embora necessários, podem variar.

Com o tempo, nosso corpo está em constante mutação - transforma-se da infância para adolescência, desta para a idade adulta e, finalmente, para a velhice. Nem por isso deixamos de ser nós mesmos. Da mesma maneira, um cão é um cão em virtude de uma organização e estrutura que ele compartilha com outros cães e que o diferencia de outros animais que também são feitos de carne, pelos, ossos, sangue...


Conheça as quatro causas
Para Aristóteles uma coisa é o que é devido a sua forma. Como, porém, o filósofo entende essa expressão? Ele compreende a forma como a explicação da coisa, a causa de algo ser aquilo que é. Na verdade, Aristóteles distingue a existência de quatro causas diferentes e complementares:


•Causa material: de que a coisa é feita? No exemplo da casa, de tijolos.

•Causa eficiente: o que fez a coisa? A construção.

•Causa formal: o que lhe dá a forma? A própria casa.

•Causa final: o que lhe deu a forma? A intenção do construtor.

Embora Aristóteles não seja materialista (vimos que a forma não é a matéria), sua explicação do mundo é mundana, está no próprio mundo. Finalmente, para o filósofo, a essência de qualquer objeto é a sua função. Diz ele que, se o olho tivesse uma alma, esta seria o olhar; se um machado tivesse uma alma, esta seria o cortar. Entendendo isso, entendemos as coisas.

Mas o pensamento aristotélico não se limitou a essa área da filosofia que podemos chamar de teoria do conhecimento ou epistemologia. Deixando de lado os domínios que deram origem a outras ciências e nos limitando à filosofia propriamente dita, Aristóteles ainda refletiu sobre a ética, a política e a poética (que, no caso, compreende não apenas a poesia, mas a obra literária e teatral).


Ética e política

No campo da ética, segundo Aristóteles, todos nós queremos ser felizes no sentido mais pleno dessa palavra. Para obter a felicidade, devemos desenvolver e exercer nossas capacidades no interior do convívio social.

Aristóteles acredita que a auto-indulgência e a autoconfiança exageradas criam conflitos com os outros e prejudicam nosso caráter. Contudo, inibir esses sentimentos também seria prejudicial. Vem daí sua célebre doutrina do justo meio, pela qual a virtude é um ponto intermediário entre dois extremos, os quais, por sua vez, constituem vícios ou defeitos de caráter.

Por exemplo, a generosidade é uma virtude que se situa entre o esbanjamento e a mesquinharia. A coragem fica entre a imprudência e a covardia; o amor-próprio, entre a vaidade e a falta de auto-estima, o desprezo por si mesmo. Nesse sentido, a ética aristotélica é uma ética do comedimento, da moderação, do afastamento de todo e qualquer excesso.

Para Aristóteles, é a ética que conduz à política. Segundo o filósofo, governar é permitir aos cidadãos viver a vida plena e feliz eticamente alcançada. O Estado, portanto, deve tornar possível o desenvolvimento e a felicidade do indivíduo. Por fim, o indivíduo só pode ser feliz em sociedade, pois o homem é, mais do que um ser social, um animal político - ou seja, que precisa estabelecer relações com outros homens.


O papel da arte

A poética tem, para Aristóteles, um papel importantíssimo nisso, na medida em que é a arte - em especial a tragédia - que nos proporciona as grandes noções sobre a vida, por meio de uma experiência emocional. Identificamo-nos com os personagens da tragédia e isso nos proporciona a catarse, uma descarga de desordens emocionais que nos purifica, seja pela piedade ou pelo terror que o conflito vivido pelas personagens desperta em nós.